Diário de SM: Um terço dos professores da rede municipal de Santa Maria esteve afastado no primeiro semestre de 2022

Pelo menos um terço dos 1.752 profissionais lotados na rede municipal de ensino esteve afastado por conta de atestados médicos. É o que aponta o balanço do primeiro semestre de 2022, em que 567 trabalhadores do município apresentaram documento para afastamento temporário de suas funções.

Em 30 dias, entre os meses de junho e julho, o número total chegou a 119 profissionais afastados. A média mensal deste ano oscila entre 80 e 100 – antes da pandemia, eram de 70 a 80 atestados mensais. Os motivos dos afastamentos não foram informados.

De acordo com a superintendente do Setor de Gestão de Pessoas da Secretaria Municipal de Educação (Smed), Solaine Massierer, nem todos esses profissionais são substituídos. Quando isso ocorre, pode ser por meio de remanejo interno das escolas ou por editais de Regime Suplementar de Trabalho (RST) propostos pela prefeitura. Em casos de atestados de professores de até 15 dias, é a escola que soluciona a substituição internamente, sendo responsabilidade do coordenador pedagógico. Em afastamentos maiores que 15 dias, a responsabilidade de suprir a vaga é da secretaria, que ocupa a vaga a partir do edital RST.

A Smed classifica os atestados médicos em três categorias, conforme os motivos apresentados: licença para tratamento de saúde, que compreende a até 15 dias de afastamento; auxílio-doença ou licença tratamento de saúde, que soma período de afastamento maior que 15 dias; e licença para saúde de familiar ou licença gestante, que possui prazo estimado conforme a demanda da necessidade de afastamento.

A professora de pré-escola na Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Aracy Barreto Sacchis Cátia Cheffer, 46 anos, ficou um período de 30 dias afastada este ano, retornando as salas de aulas em 29 de abril, depois de se recuperar de uma cirurgia para a retirada de um nódulo na mama direita. Ela comenta como foi o período afastada, a recuperação e o retorno à escola.

– Foi um pouco difícil para mim porque não consigo ficar parada em casa. Então, fiquei um pouco nervosa, mas correu tudo bem. Quando voltei para dar aula, tive uma excelente recepção dos alunos, com cartazes, festa e lanches – conta a professora.

Saúde mental fragilizada

O Sindicato dos Professores Municipais de Santa Maria (Sinprosm) chama a atenção para o número de professores que se afastaram por problemas de saúde neste ano, especificamente em casos de saúde mental. Rafael Torres, coordenador do sindicato, alerta para a realidade de professores que estão lidando com o esgotamento físico e mental, e muitos sem o diagnóstico ou ajuda adequada para tratamento.

– É um número de afastamentos muito alto frente ao quadro de professores que nós temos. Foi um número que chamou muita atenção ao retornar presencial nas escolas, pois percebemos a falta de professores por conta de saúde mental. Embora não tenhamos um quantitativo, acreditamos que grande parte deles seja por esgotamento físico e mental, porque é o que ouvimos dos colegas – destaca Torres.

A Smed informa que a parcela de afastamentos relacionados à saúde mental segue “dentro da normalidade”, mas que, mesmo assim, existe um acompanhamento dos casos. Solaine reiterou que ações serão planejadas caso haja oscilação positiva destes casos.

— Trabalhamos intensamente numa ação preventiva, de acolhimento. Todos nós estamos cansados, teve a demanda com a readaptação do presencial, teve os impactos da pandemia. Nós temos uma formação com os professores, uma vez por mês, que para toda a rede pra recebê-la. Eles trazem suas preocupações, e nós continuamos nosso planejamento a partir das demandas deles — explica a superintendente do Setor de Gestão de Pessoas da Smed.

Na Emef Fontoura Ilha, atualmente, são quatro professores afastados por motivos de saúde, explica a diretora Cristiane Almeida. Com 54 anos, a professora de biologia Lúcia Helena Minuzzi Vieira vai entrar em afastamento a partir de agosto. Ela destaca que o problema não é pedagógico, mas de sobrecarga de trabalho, atrelada a problemas de saúde na família:

– Vou ficar com apenas as 20 horas no município, na escola Duque de Caxias, porque sou lotada lá.

Paula Merenock, 46 anos, conta que chegou a receber três atendimentos psicológicos em 2021. Eles foram fornecidos pela escola onde ela trabalha, a Emef Aracy Barreto Sacchis. Contudo, desde então, ela não recebe acompanhamento.

– Acredito que o estresse seja o principal motivo. Não é fácil, sofremos muita pressão e são muitas demandas. Por conta do estresse, ficamos com a imunidade baixa, o que nos deixa suscetíveis a doenças – diz.

A professora esteve afastada em duas ocasiões este ano. A primeira por Covid-19, em março, e a segunda no início de julho, por problemas respiratórios.

Estudo acompanha a saúde mental dos professores desde 2020

O Núcleo de Estudos em Contextos em Desenvolvimento Humano: família e escola (Nedefe), da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) pesquisa sobre a rotina de trabalho e saúde mental dos professores durante a após a pandemia. Elenise Coelho, mestra em psicologia da saúde e membra do Nedefe, conta que através de rodas de conversa em 5 escolas de Santa Maria, foi identificado que mesmo antes da pandemia, os professores conviviam com a sobrecarga e desvalorização:

— A pandemia agravou essa situação que já estava difícil, porque a partir do momento que se teve que dar aula em casa, sem suporte e instrumentalização, isso gerou ainda mais estresse. A carga horária de trabalho foi extrapolada, além das próprias questões da pandemia, teve gente que perdeu familiares ou tiveram pessoas hospitalizadas por um longo tempo. E a escola pública também presta um serviço assistencial aos alunos, no sentido da alimentação e da segurança, e geralmente é o professor que está ali presente.

Elenise também ressalta a pressão que os professores da rede pública sentem em recuperar as lacunas de aprendizagem perdidas durante o ensino remoto. Ela conta que mesmo com as readaptações feitas nas políticas educacionais para viabilizar o ensino em casa, as metas de aprendizagem e os indicadores não foram flexibilizados, e os professores foram diretamente cobrados, contribuindo para o agravamento das questões de saúde.

As oficinas da Nedefe estão vigentes até o momento, e desenvolvem rodas de conversa mensais com professores das séries iniciais e finais do ensino fundamental de 5 escolas de Santa Maria. Nos encontros, são debatidos temas estabelecidos conforme as demandas apresentadas anteriormente pelos professores.