“O direito à educação está sendo atacado no mundo todo, mas principalmente no Brasil”

O professor Daniel Cara, da Faculdade de Educação da USP, dirigente da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e vencedor do Prêmio Darcy Ribeiro, abriu na noite desta segunda-feira (2) a 8ª edição do Seminário Educação em Foco, promovido pelo Sindicato dos Professores Municipais de Santa Maria. Realizado totalmente online, o evento bienal pretende debater a educação em um cenário de mudanças aceleradas, com a retomada das atividades presenciais nas escolas após um longo período de adaptações com as medidas necessárias para o enfrentamento da pandemia.

Trabalhar a formação sindical, segundo a coordenadora de Organização e Patrimônio do Sinprosm, Martha Najar, tem o seu sentido multiplicado em situações de mudanças. “Reafirmamos o sindicato não só como espaço de mobilização e luta pelos direitos, mas também de formação. Desde março de 2020, quando nos afastamos fisicamente da escola e dos alunos, em um cenário de incertezas, procuramos o caminho da formação para encontrarmos as respostas de que precisávamos”, disse na mensagem de abertura.

PARA QUE(M) SERVE A EDUCAÇÃO

O palestrante busca na Constituição Federal a resposta para a questão central do seminário: pleno desenvolvimento da pessoa, o preparo para o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho. Cara relaciona os ataques à educação e ao seu papel de emancipação do indivíduo com a emergência dos grupos ultrarreacionários e ultraliberais ao redor do mundo, em um movimento que pretende inclusive ditar a forma de agir e se comportar. “O Brasil tem problemas estruturais que são nossos. A educação não se afirma como um direito porque ainda tem em sua construção social e histórica todas as marcas da escravidão”, afirma citando a obra de Anísio Teixeira. Um dos exemplos, ocorrido na pandemia, é a pressão pelas famílias ricas pelo retorno às aulas sem condições sanitárias, tratando a educação como serviço e não como direito. “O Brasil ainda é um país que trabalha na vertente da casa grande e da senzala. Na prática, a burguesia retrógrada brasileira pensa, efetivamente, que ela é cidadã e todos os demais brasileiros são cidadãos de segunda classe. O mérito dessas pessoas, por toda uma cadeia de privilégios, é ter dinheiro”.

O pensamento neoliberal defende que a meritocracia deve reger todas os movimentos da sociedade, explica Cara, ignorando que as pessoas tem pontos de partidas diferentes em uma sociedade desigual. “Para o neoliberalismo, manter alguma desigualdade é interessante”. Nesta perspectiva, a escola deve formar um cidadão que é empreendedor de si mesmo, preparado para a competição. Investir em salário de professor, melhoria de infraestrutura, formação de professores, não trariam necessariamente resultados quando mensurados em avaliação de larga escala, mas sim o aprendizado do aluno. Essa lógica começou no Governo Itamar, avançou no Governo Fernando Henrique e não foi desconstruído nos Governos Lula e Dilma, quando o ministro Haddad implementa o IDEB, que metrifica o trabalho dos professores. “Essa lógica não foi descontruída por que quem faz a gestão da educação não são os educadores, mas sim quem não leu sobre pedagogia e nunca pisou na escola pública. Isso faz muita diferença”. O Novo Regime Fiscal, criado no governo Temer, que congela os investimentos sociais por 20 anos, gerando as atuais crises no SUS, nas universidades, é uma ferramenta do pensamento neoliberal que vê necessidade em diminuir as funções do Estado. “Se essa emenda não for revogada, o Brasil entra em colapso absoluto em dois ou três anos, com ou sem Bolsonaro”, garante Cara.

A live está disponível, na íntegra, no Facebook e no canal do Sinprosm no You Tube. Tem 1h33min de duração.

AGENDA

Na próxima quarta-feira (4) a pauta será a educação infantil. A professora Suely Amaral Mello palestra às 19 horas com o tema “O papel da Educação Infantil na constituição da personalidade e da inteligência da pessoa”.

Suely é graduada em Letras, mestre e doutora em Educação pela Universidade Federal de São Carlos. Professora aposentada do Departamento de Didática da Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus de Marília, professora colaboradora do Programa de Pós Graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP, membro do grupo de pesquisa Implicações Pedagógicas da Teoria Histórico-Cultural, co-coordenadora do Grupo de Estudo em Educação Infantil: teoria e práticas, assessora da Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura de São Paulo.